sexta-feira, 31 de agosto de 2012


Não sei que escrever
Senão que falha a mão
Na tentativa dúbia
De expor um pensamento
Um sentimento que soltou-se
Do meu peito aturdido
E agora nada alcança
E nada sabe de si
Ou para onde vai
Perdido, desregulado
Dançando ou penando
Ele desprendeu-se
E agora apenas vai
Eu calo o grito na fonte
Ele não olha atrás
Mas leva- me consigo
Pelas a ruas mal-iluminadas
Do futuro
Na valsa indecisa do presente
Pergunto-me se ficarás aí, deitando sobre mim estes teus pesados olhos. E que estranho prazer podes encontrar nesta ação paralítica de contemplar-me em tão ausente instante, em tão desconexo momento... Acaso não sabes que é desconfortável, que é incômodo? Não vês, afinal, o que devias ver, sem sequer olhar?!
Estar na mira de uma estranha, de uma criança nos gestos... Olho e angustio com essa forma

 invasora de comunicação. Não há tantos focos neste espaço? Por que ela tem que escolher a mim? Tão calado, tão indiferente, nem me importo com quem seja ou o que faça. Pode haver a luz do sol ou os troncos das árvores, pode haver um cenário de sombras que requer atenção... Não importa! Ela escolhe sempre por ponto a mim!
“Indiferente! Fique indiferente!”- Digo a mim mesmo!- Levanto-me, preciso andar, não consigo ficar imóvel. Buscarei outros focos! Passo perto dela, verei se me diz de uma vez o que deseja, afinal... Repouso junto a ela. Ela que nada diz. Ao redor caminho. Ela que nada diz... Vou ao longe, vou ao largo, vou embora... Ela nada diz!
Então por que insistir em assim olhar a um estranho? Fazê-lo pensar tantas coisas, ter que pensar em causas e razões, ter que imaginá-la juntamente com tudo isso... Ter que pensá-la!

Desço estas ruas frias

Inflamando os ares
Como quem incendeia almas



Escorrendo pelos espaços
Acariciando o chão
Com o peso dos meus pés


Eu busco um sopro sonoro
Encontro a solidão esperada
E andamos de mãos atadas



Bebemos o silêncio



Janelas abertas veem passar
Nos meus movimentos incertos
Uma irreverência ébria



E eu fecho os olhos
Para melhor abraçar
Este vento cortante



Abraços soam ameaças



Entre os dedos uma canção
Beijando a boca 
Uma chuva mansa



E os pesamentos caem
Enfeitando junto com o tempo
O caminho que reinvento



Qualquer paixão 
Não é mera coincidência
Um sopro, uma flor, um compasso

Dê-me a mão pra uma dança lenta






Abraçar um pensamento
Que vem junto com a brisa...
Abraçar com violência
E depois ter apenas o vácuo...
E por que, então, inda assim,
O espírito fica tão cheio??

Muda num canto

Estas palavras de agora
Ainda as desconheço
Estavam postas num canto cinza
da casa
Esperando, no frio esquecimento,
No calor desejando ardentes
Que as tomasse 
Que as despisse
Que as libertasse
Palavras de fundo de copo
Medianas amigas da cinza
Deitavam em qualquer 
raio de lua
Serviam-se sobre qualquer mesa
E ainda assim as esqueciam
Como juras de amor
Ou promessas do porvir
Ou adeus de namorados
Estas sentenças de canto de alma
Estes atropelos de sentimentos
Dormem agora dentro
da minha boca calada
Nos braços de algum tolo pensamento.

Estampas

Bebi tuas lágrimas
No outono passado
Depois da conversa
Naquela taverna de sempre

Segui teus passos
Por uma madrugada
Ouvindo teus sonhos
E as confissões do teu medo

Tomei o teu corpo
Nos espasmos da febre
Do teu desejo incontido
Da tua poesia turva

Mas esta noite se esvai
Como tudo o mais
No abanar das plumas
Do meu novo leque...




Leva-me a noite

Sequer questiono

Qual é o destino final
Abro os braços
Para qualquer aperto invisível
Indizível
Desesperado
Daquilo que 
Sequer conheço
Como quem busca
Dentro do infinito
Uma pequena tortura

Uma parte de mim caminha noite afora

Buscando estrelas perdidas na calçada
Bebendo os sonhos do luar
Suspirando sobre corpos perfeitos

A outra está insone na alcova
Pintando meu autorretrato, forma esdrúxula
Numa parede de memórias recém-criadas


Olho da janela os passos que invadem o tempo
E roubo minha própria cena
Lá vou de mãos nos bolsos
Sonhador displicente
Contemplando outro eu numa janela distante