Desci a velha rua, quando a neblina ainda era parte da
paisagem e eu parte dela. Caminhava em direção ao píer e já trazia no peito uma
lufada daquele vento, a maresia não saia do meu corpo. Em minha memória alguns vestígios, umas
lembranças bem lentas e esparsas de uns risos, umas cenas...
Não sei dizer qual o sentido daquela caminhada. Apenas sei
que quando dei por mim lá estava cheirando outra vez os becos daquelas ruas e
descendo aquela ladeira... Dentro de mim, era tudo imóvel e silêncio a minha
linguagem, pois sentia, que embora desertas, aquelas vias gritavam, carregavam
em si o murmúrio das gentes, até as festas e arruaças de uns boêmios, como eu...
Acho que até mesmo gravaram nos paralelepípedos a tua risada leve e
dissimulada!
Sim! Talvez estivesse procurando a cumplicidade destes
lugares que passastes tão rápido e tão leve como em mim. Talvez apenas não me
satisfizesse com as marcas na minha alma, o perfume no meu corpo escorrendo ao
tempo breve, talvez não quisesse ocultar teus passos, e sim, compartilhar com o
que me pudesse compreender, sem mágoas ou juramentos, ou culpas e desculpas a
sensação indelével do teu passar. Talvez eu apenas quisesse dizer, muda, o que
as vias já gritavam. Conjugar, outra vez teu verbo secreto, sem muitas nuanças
e subterfúgios... Então, só quem me compreenderia seria este caminho que vai
descambar no píer.
Olhar as barcas que dançam nas ondas do amanhecer, e viver na minha quietude todo o sinuoso movimento das vagas, porque dentro em mim sentia-me tão porto, que já me ancoravam certas saudades...